segunda-feira, 8 de junho de 2009

Poesia - Nossa senhora da Esquina


  
Morreu ontem,
com muita dignidade,
a puta mais velha da cidade.
 
Da sua idade
não estou bem certo,
mas sei que dos oitenta
chegou perto.
 
Veio a morte
pela parede fria
do seu quarto,
onde jazia
um quadro de São Jorge.
 
Usava um antigo
vestido vermelho,
mesma cor do batom
na boca,
que nunca abriu
pra falar mal do governo.
 
Por esposas iradas,
mas de uma vez,
foi desafiada.
Sofreu sevícias
na mão dos homens
da policia.
 
Um cliente muito terno,
que escrevia poesias
em um caderno,
lhe jurou amor eterno.
Deu jóia,
roupa cara
comida para o sustento...
Mas ela fugiu
quando ele propôs a ela
um casamento.
 
Ela não se contentava
com paixões reles.
Não queria ser tratada
igual as outras mulheres.
Que se vendem para os maridos,
pr´os patrões e para os filhos;
em suas sinas resignadas...
A troco de nada!
 
Preferiu os bregas,
o Parque do Ibirapuera
e idas ocasionais a São Vicente.
 
Sempre achou deprimente
visitar o filho no domingo.
Macarrão
Faustão
e a nora tida como santa.
 
Espanta
esse critério
que define
o que é
e o que não é
sério.
A puta mais velha da cidade...
 
Morreu sem alarde
sem companhia.
Morreu de pneumonia;
mas não houve melancolia
e nem luto.
 
Com sua morte anunciada,
as putas os putos
largaram as calçadas
do Trianom
e foram fazer folia
lá longe, na periferia,
em que ela morava.
Foi um grande frissom!!!
 
Teve festa com seresta
com samba e com cachaça.
Veio criança, velho,politico...
E até o padre, sumido,
deu o ar da sua graça.
 
Todos celebraram a passagem
daquela dama fina
que um dia
saiu menina
do raio da silibrina.
E agora é canonizada
a Nossa Senhora da Esquina.

Augusto

2 comentários:

Maíra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Maíra disse...

Que ótimo!!!!!