Para os apaixonados, a unidade de classes se dá única e exclusivamente no amor. Para os revolucionários, na luta. Para os céticos, na morte.
Para além dessas linhas de pensamento está a de que somos todos iguais no lixo.
Dizem que uma das melhores formas de se conhecer uma pessoa é examinar seu lixo.
Pode parecer desagradável, mas os materiais que compõem o lixo e a forma como ele é organizado revelam muito sobre seu dono.
De maneira gradativa, na lixeira de casa, no contêiner do condomínio, no caminhão de lixo e nos aterros sanitários as identidades se misturam.
Independentemente de posição social, crença, origem, idade... tudo e todos se encontram no lixo que decompõe parte de nossa história.
São sobras de refeições, contas vencidas, notícias caducas, cartas rasgadas, embalagens vazias, roupas desbotadas...
São inúmeras cores, cheiros e sabores se misturando sem preconceitos ou pudores.
Pensando nisso, dever-nos-íamos dar mais valor ao lixo nosso de cada dia.
Nossa produção de resíduos é tão vertiginosa quanto nosso consumismo. Em média, um ser humano produz cinco quilos de lixo por semana.
É comum pensar que o lixo não é um problema nosso, afinal é papel do Estado manter a cidade limpa. Cobram-se, inclusive, impostos por isso, não é?
Esse raciocínio simplista tem transformado a "vida refugada" em um dos mais graves problemas sociais da atualidade.
As enchentes de verão atestam a estimativa de que pelo menos 30% do lixo brasileiro ficam espalhados pelas ruas das grandes cidades.
Quase 90% das mais de 240 mil toneladas de lixo produzidas por dia no Brasil são jogadas a céu aberto.
Para agravar a situação, a miséria e a falta de oportunidades levam pessoas a viverem no entorno desses lixões, comendo e vendendo o que ainda pode ser aproveitado.
Recentemente, uma menina de 15 anos morreu depois de ter sido atropelada por um trator no lixão da Estrutural, que fica a 10 quilômetros do centro de Brasília.
O lixo cresce como reflexo de uma sociedade não adepta a uma série de práticas como redução, reciclagem e reutilização.
Como remete à sujeira, ao fedor e à tragédia humana, o tema em questão é visto e tratado pelos políticos como uma coisa menor que não rende mídia e voto.
Não é à toa que a reciclagem no Brasil representa somente 2% do total do lixo gerado.
Embora os dejetos variem de acordo com as características econômicas, sociais e culturais de quem o produz, vivemos no mesmo planeta.
É esse fato que faz com que o lixo obrigatoriamente nos una.
Daniel Campos é poeta, escritor, jornalista pós-graduado em Comunicação Criativa pela ABJL e autor do portal de poesia e literatura www.danielcampos.biz
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